Basquete: Filha de Léo Figueiró vai disputar a liga universitária dos Estados Unidos
Quarta-feira, 20/11/2024 - 03:37
Quadras, tabelas e bolas laranjas sempre foram peças do mundo de Manuella Alves. Hoje, aos 18 anos, a jovem, que é filha do técnico do Vasco e ex-jogador, Léo Figueiró, é uma das revelações do basquete brasileiro e vem ganhando destaque no cenário internacional. A ala assinou com a Universidade de Illinois, na última semana, e vai estrear na Liga de Basquete Universitário Norte-Americano (NCAA) em 2025. Em entrevista ao ge, Manu e Léo Figueiró contaram detalhes da trajetória da jogadora até a assinatura do contrato, a forte relação da família com o basquete e comentaram as mensagens de Caitlin Clark, a caloura do ano da WNBA.

Veja lances de Manu Alves, pela seleção sub-18, na Copa América de basquete




As constantes mudanças de cidade com a família para acompanhar o trabalho do pai dificultaram na busca por uma equipe de basquete feminina em alguns lugares. Sem outra opção para treinar, Manu cresceu jogando majoritariamente em times masculinos até seus 16 anos.

Léo Figueiró conta sobre primeira participação na seleção de Manu


O privilégio de ser filha de Léo Figueiró, técnico que já comandou times de camisa como Corinthians, Botafogo e Vasco, não gerou nenhum tipo de comodismo. O parentesco que dá orgulho também já mexeu com o emocional da jogadora, que chegou a duvidar de seu potencial ao ouvir comentários que desmereciam seu trabalho como atleta.

- Fui falar com meu pai: 'Estou chateada, as pessoas acham que estou lá por sua causa'. Então, ele retrucava: 'Sou eu que estou jogando na seleção ou é você? Então, você não está aí por minha causa' - lembrou Manu.



O reconhecimento de seu talento veio recentemente, ao assinar na semana passada com a Universidade de Illinois, para integrar a equipe que disputará a Liga Universitária Norte-Americana no ano que vem - a famosa porta de entrada para a WNBA.

Primeira seleção

Mas o caminho da brasileira foi longo até Illinois. A jogadora começou na seleção sub-14 quando tinha apenas 12 anos. Léo conta que não foi fácil para sua filha estar entre meninas mais velhas vestindo a camisa do Brasil, mas que ela sempre foi muito destemida.

- Ela falou para mim: 'Pai, você tem que ir comigo, eu estou morrendo de medo'. Fui com ela, o jogo era em Limeira. Cheguei pronto a ficar o dia inteiro porque era sua primeira seleção. Aí, ela deixou a mala e foi almoçar com o grupo. Quando voltou disse: 'Aí, pai, pode ir embora, eu já conheci o pessoal.' Foi muito engraçado.

Por ser muito jovem para a equipe, o intuito da diretora do grupo na época era que Manu se ambientasse e conhecesse as outras jogadoras. No entanto, ela avisou a Léo que sua filha seria o último corte, devido à idade.

- Comprei um cordão de presente e entreguei a ela. Então ela me contou: 'Pô, pai, fui cortada'. Eu respondi: 'Estou muito contente, muito orgulhoso de você, queria te dar este presente só pela sua coragem de vir aqui com 12 anos, treinar junto com elas, mais velhas que você'. Aí, ela respondeu prontamente: 'Ah, pai, eu também estou muito orgulhosa de mim, tenho doze anos, nas próximas eu vou vir'. Em seguida, desandou a chorar e dizer 'Mas eu queria ficaaaar!' - contou o pai.

Chegada aos EUA

Logo o convite para alçar voos mais longos chegou. O destino seria Kissimmee, na Flórida. Manu não sabia sequer falar inglês e se assustou um pouco com a mudança, mas foi se acostumando e, com a ajuda da rede de apoio dos pais, entendeu que a decisão havia sido precisa.



- Nos primeiros meses foi muito difícil, não vou falar que foi legal. Aprender uma língua nova, estar longe da família...Mas fui me acostumando e percebendo as diferenças do basquete nos Estados Unidos e no Brasil. Se eles veem potencial, realmente investem. Tenho a sorte de ter sido reconhecida aqui e fui vista por várias universidades - contou, tranquila.

Em dezembro de 2023, Manu obteve sua primeira conquista pela camisa verde e amarela. A brasileira foi campeã sul-americana com a seleção sub-17. Na Copa América de 2024, já pela sub-18, terminaram em 4º lugar e garantiram uma vaga no Mundial sub-19 de 2025.



Recrutamento para a NCAA

Durante o high school (ensino médio americano), o desempenho de Manu atraiu a atenção de mais de 20 universidades. No entanto, a brasileira ficou entre cinco escolhas: Louisville, North Carolina, Illinois, Miami e Iowa. Para se decidir, ela precisou visitar cada uma delas e treinar com as possíveis companheiras de quadra.



- Quando você faz a visita, eles querem que tudo seja perfeito. Você chega e tem seu nome escrito em letras enormes, te dão comida, doces, te levam para o melhor restaurante da cidade, te hospedam no melhor hotel. Você tira foto com o uniforme, faz um tour pela faculdade. É normal ficar deslumbrada à primeira vista - contou Manu.

Caitlin Clark

No entanto, mais "pé no chão" que a maioria das pessoas de sua idade, nem o recado da caloura do ano da WNBA, Caitlin Clark, em suas redes sociais, foi o suficiente para fazer a cabeça de Manuella. A atleta se manifestou em uma publicação sobre a visita à Universidade de Iowa, ex-casa da maior pontuadora da história da NCAA, convidando a brasileira a se juntar ao clube.



Decisão por Illinois

Treinada por Kim Mulkey, campeã olímpica (Los Angeles 1984) e mentora de nomes como a sensação da WNBA Angel Reese, que atualmente joga pelo Chicago Sky, a atleta brasileira considerou o conselho da técnica sobre a decisão por Illinois.

- Eu me importo muito com o desenvolvimento. Sei que a jogadora que sou agora não será a mesma daqui a alguns anos. Quero desenvolver minhas habilidades, meu chute, meu corte. Queria ir para uma faculdade que me oferecesse isso. Kim me sugeriu a perguntar por que não, em vez de por que sim. Então, pensei em por que não ir para Illinois e não achei resposta. Tem tudo o que preciso lá, mas dá um frio na barriga dizer não para as outras - desabafou.



Com a escolha pela Universidade de Illinois, o próximo endereço de Manu é Champaign, uma cidade a aproximadamente duas horas de Chicago, terra em que outra brasileira, Kamilla Cardoso, tem brilhado pela WNBA.

- Já conversei com ela, já nos conhecemos. Ela acompanhou a final da EIBL, em Chicago. Talvez em um futuro próximo poderemos jogar juntas na seleção brasileira. Talvez eu vá visitá-la, ainda não sei - comentou.



Família em quadra

À exceção da mãe, Joana, a família inteira escolheu o basquete como profissão. O irmão, João Gabriel, joga na Espanha, em Madri. Desde pequenos os dois jogavam no quintal de casa enquanto o pai os assistia e se divertia, tomando seu café. A brincadeira entre os três virou um ritual de férias até hoje.



Segundo Léo, Manu costumava se queixar pois o pai acabava assistindo às partidas do irmão, uma vez que pai e filho eram do Corinthians. Assistir aos jogos de Manu era algo menos frequente, pois precisava atravessar a cidade de São Paulo, já que a filha jogava em Osasco.

- Peguei o carro, fui ver o jogo dela. Chegando lá, ela estava mole. Aí, o jogo acabou e ela me perguntou: 'Como é que foi, pai?'. Eu disse: 'Você realmente quer que eu fale ou não?' Então, falei: 'Ah, filha, na boa? Jogou mole, muita risadinha', dei uma bronca. Prontamente ela respondeu: Ah, é pai? Porque todo mundo disse que eu joguei bem, menos você. Fiz 22 pontos e peguei 17 rebotes'. Nessa hora eu entendi e disse: 'Você tem que ir jogar fora, se jogando mole faz isso, precisa ir embora' - lembrou.

Los Angeles 2028 e WNBA

Apesar de decidir seguir carreira fora do Brasil, o amor pelo país e o sonho de representá-lo em competições adultas permanecem bem vivos. Manu lamenta a falta de investimento no basquete feminino e garante que se tivesse as mesmas oportunidades aqui, certamente escolheria ficar.

- Faz um tempo que estou na base, mas realmente quero poder participar da seleção adulta, em algum momento, quando estiver pronta. Quero continuar dentro deste ciclo. Acho que temos muitos talentos, hoje, no basquete feminino, para poder participar das Olimpíadas de 2028 - analisou.

Manu Alves comenta momento do basquete feminino e sonho de LA 2028


Ainda assim, ela reforça a importância do crescente número de brasileiras jogando na NCAA e confirma seu desejo de, um dia, entrar para a liga profissional, a WNBA.

- Todas querem chegar a esse nível e é muito legal ver que as brasileiras chegaram lá, para outras jogadoras entenderem que não é impossível. Agora, principalmente, com tantas de nós no NCAA. A Alexia (Dagba), em Georgetown, a Ayla (McDowell) indo para South Carolina, Taissa (Queiroz) indo para North Carolina. Não é mais impossível ver as brasileiras na WNBA ou na Europa - observou a atleta.

Fonte: ge